Olhar mais além
Olho-o nos olhos e vejo tristeza!
Olho-o nos olhos e vejo vergonha!
Olho-o nos olhos e vejo inquietação!
Olho-o nos olhos e vejo vazio!
Aproximo-me e falo. Não obtenho resposta.
Falo novamente e mente-me na tentativa de me evitar, na tentativa de fugir.
Não desisto pois reparo que algo não está bem. E é então que me apercebo que não consegue ler. Tem 12 anos, anda no 6º ano e não consegue dizer-me qual a letra pela qual inicia uma palavra ou o som da letra "P" com a letra "A".
Fico chocada mas tento não o demonstrar na minha face. Levo-o para outro lugar. Um lugar escondido, afastado dos olhares dos colegas, onde poderia estar à vontade para errar, para questionar.
Pouco consigo retirar dele. O tempo passa e nada.
E ali, o "bad boy" da turma, o rapaz mal-comportado e rei das asneiras olha-me com lágrimas nos olhos e pede para terminar o trabalho em casa com a promessa de regressar no dia seguinte...
Mostro que estou ali para o ajudar, que não precisa ter vergonha. Deixo-o ir.
Agradece-me!
Sinto uma vontade imensa de chorar!! Venho depois a saber que o pai já faleceu e que a mãe não se preocupa com os seus estudos. É chamada à escola e não comparece.
No resto do meu dia não me saiu do pensamento este rapaz, não conseguia esquecer a vulnerabilidade e o abandono que via nele. Não saía da minha mente a sua face, o seu olhar, a sua tristeza.
Pedi a Deus por ele, para que amanhã lhe dê força para não ceder ao comodismo ou à vergonha e simplesmente aparecer para este "apoio" não só ao estudo mas também ao Coração.
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