Diana's Anatomy

Hoje logo pela manhã estava com um estagiário de enfermagem enquanto ele ia algaliar uma grávida. Ele pega numa algália, num tubo de oxigenação com máscara, numa seringa e numa garrafa de soro fisiológico. Eu não percebia o que ele estava a fazer e por isso perguntei-lhe  para que era todo aquele material se o que se tinha que  fazer era apenas algaliar a senhora. Ele respondeu-me "aqui não  temos sacos coletores. Temos de improvisar". Entao cortou a máscara ficando apenas com o tubo de oxigénio, uniu a algália ao tubo com a parte externa da seringa e, após esvaziar a garrafa de soro fisiológico e fazer um furo, fez passar o tubo para o interior da garrafa que servia assim de reservatório de urina.
(A "geringonça" está nas imagens seguintes)




Vi em seguida um homem com uma anemia absurda!! O valor de hemoglobina era de 2,4g/dl! (Num homem o normal ronda os 13g/dl). Necessitava de uma transfusão urgentemente. O problema é que aqui não há banco de sangue. Têm de vir família e amigos para testar se podem ser dadores. O senhor é de uma terra a 40 Km daqui! Veio sozinho e a pé ao hospital. Não tendo ninguém com ele, não tendo número de telemóvel de ninguém, pediu alta para voltar a casa e trazer depois a família. E lá o deixaram ir, mesmo com risco de cair pelo caminho, sozinho! De morrer, sozinho!
A mim choca-me isto ser permitido! Choca-me ser possível deixar um ser humano sem prestação de cuidados adequados quando está nestas condições! Choca-me não haver uma solução para estes casos, se fazer sofrer e se colocar em risco vidas desta forma, sendo algo com uma solução tão simples.

Esta semana houve também o caso de um menino de 10 anos que foi mordido por uma cobra. Estava internado com o braço completamente inflamado, com bolhas e hemorragias já a estenderem-se ao tórax. Enquanto os clínicos decidiam qual a melhor abordagem para o rapaz, os pais batem à porta e afirmam que querem levá-lo embora para irem a curandeiros. E lá foram, com o aviso que o filho ia piorar e que não voltassem quando estivesse pior porque seria tarde demais e aumentaria a taxa de mortes do hospital.
Fiquei chocada com esta conversa e expus aaminha opinião. Percebi então que tudo aqui é muito racional! Taxa de cura, taxa de morte, taxa de abandono terapêutico, taxa, taxa, taxa. Mais do que seres humanos, as pessoas acabam por ser vistas como números. Tentam a todo o custo não descer o ranking do hospital. E tudo isto é visto de forma normal.
A mim deixa-me a pensar. É revoltante ver como lidam com vida/morte. Ainda me tento habituar à leviandade com que aqui se fala da morte.
É uma cultura completamente diferente, num país completamente diferente, mentalidades completamente diferentes mas com pessoas que sentem como qualquer outro ser humano no mundo.

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